19 de fevereiro de 2009

O Lutador



"Rourke acerta em cheio em todas as cenas de seu personagem"

Sempre quando irei falar de um filme de Darren Aronofsky – responsável por obras como PI, Réquiem para um sonho e Fonte da vida – , vejo o filme com meu dicionário em mãos. Por quê? Para achar novas palavras para descrever estes filmes, uma forma de inovação. Ficar sempre em adjetivos, como: Soberbo, magnífico , esplendoroso ; cansa tanto a mim quanto ao leitor. Nestas idas ao dicionário, encontrei um adjetivo ainda não usado para definir algum filme deste soberbo diretor, por minha parte. Suntuoso.

Adaptação do livro que Robert Siegel escreveu sobre Randy \"The Ram\" Robinson, um astro ficcional da luta - livre dos anos 1980. O filme nos mostra a trajetória deste lutador The Ram (Mickey Rourke) , que vinte anos depois do seu auge, segue fazendo a única coisa que sabe: lutar. Mas os tempos são outros, ele envelheceu, os fãs são poucos e o dinheiro é escasso. Mesmo assim segue se apresentando. Até o enfarto, depois de uma luta...

Forçado pelos médicos a interromper sua longeva carreira, ele começa a trabalhar no balcão de frios de um supermercado. Enquanto isso, tenta fazer as pazes com sua filha (Evan Rachel Wood) e procura algum alento romântico com uma stripper (Marisa Tomei). Mas surge, então, a proposta para uma luta com o seu maior rival, o Aiatolá (Ernest Miller), e fica difícil para The Ram resistir...

Alguém se lembrou de Rocky, um lutador lendo a sinopse? Eu, sim. A sinopse sugere uma comparação gigantesca com o filme do garanhão italiano. Com um único porém , a superação que Rocky sempre passava para o espectador não está presente de forma tão direta , como a sinopse faz a pensar. A superação de Ram nunca é mostrada para nós com treinamentos ou corridas. Ram segue um único propósito na vida que é continuar custando custe o que custar sem a esperança de um futuro bom. Muitas vezes dormindo no próprio carro, e vivendo de bebida e strippers.

O roteiro de Siegel se enfoca bem no lado humano de Ram. Desde o começo nos identificamos com seu personagem e com suas ações. Independente de quaisquer que sejam. Já que Ram nos mostra muitos defeitos também. Por exemplo, sua aproximação com a filha só depois do infarto, ou sua teimosia em continuar lutando contra a própria saúde. Ram nos mostra também que não é um lutador sedento por sangue como nos mostra nos ringues, mas uma pessoa que pode ser muito sentimental as vezes. Eis que surge Rourke.

Sem Michael Rourke provavelmente o filme de Aronofsky iria se perder num clichê e acabar como “Luta pela Esperança”. Rourke ator infelizmente desconhecido pela nova geração de espectadores , por ter uma carreira extremamente decadente dos anos 90 para cá. Rourke nos mostra a alma de seu personagem em mínimos detalhes ao espectador. Só vi duas atuações tão bem sucedidas neste quesito nos últimos anos. Heath Ledger como o Coringa e Javier Bardem como Anton Schugar.

Rourke acerta em cheio em todas as cenas de seu personagem envolvendo os sentimentos deste lutador. Desde a aproximação com a filha até seu envolvimento com uma stripper. E sua ultima cena devo dizer que me deixou paralisado, e se esta cena não é digna de ganhar uma estatueta, confesso que não sei o que a Academia procura.

Além de Rourke, outras duas atrizes se destacam também. Evan Rachel Wood mostra bem a barreira que a filha sempre coloca entre seus sentimentos por seu pai , enquanto Marisa Tomei faz um dos melhores trabalhos de sua carreira , a interpretar uma stripper extremamente ousada em todos os aspectos.

Já a trilha sonora do sempre extraordinário Clint Mansell nos relembra velhos tempos do punk rock, e sua indicação ao Oscar já está sempre garantida com as parcerias com Aronofsky. Basta lembrar-se de Réquiem para um sonho e Fonte da Vida.

Utilizando de uma técnica extremamente impecável, Aronofsky nos conquista agora , não com seus cortes sempre esteticamente irresistíveis , mas com a câmera na mão , sempre acompanhando seu personagem principal com a mesma inspiração. E aquele diretor extraordinário que um dia nos fez indagar sobre a equação matemática PI , que nos deixou em choque com sua obra-prima Réquiem para um sonho , e nos fez admirar sua obra-prima Fonte da Vida. Agora nos coloca em mãos um dos filmes mais emocionantes dos últimos tempos. Aquele que te faz pensar pode também te fazer chorar.

(5 estrelas em 5)

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