26 de fevereiro de 2011

Análises e derrotas do Oscar 2011:


Na noite deste domingo (27), 22h30min no horário de Brasília, foram anunciados os vencedores do Oscar 2011. Sempre gostei de dar meus palpites sobre os indicados e dessa vez fui surpreendido em algumas indicações e em vitórias também. O Oscar de 2011 teve momentos maravilhosos e outros calamitosos.




Pontos positivos:

• Menos piadas e um tom de maior seriedade

• Anne Hathaway e James Franco twittando

• Orquestra

• Decote da Mila Kunis

• Minha esposa, Natalie Portman: http://bit.ly/dZn4lm

• Jennifer Lawrence deslumbrante

• Bale citando Dicky

• 4 prêmios para Origem

• Kirk Douglas



Pontos Negativos:

• Menos piadas e um tom de maior seriedade

• Anne Hathaway e James Franco

• Só 4 prêmios para Origem

• Oscar de melhor diretor

• Oscar de melhor atriz coadjuvante e o desastroso discurso de Melissa Leo

• Não ser eu levando a Natalie Portman para o palco.



Os vencedores do Oscar 2011:



- Melhor Filme (1º acerto)



A Rede Social



O Discurso do Rei



A Origem



Toy Story 3



127 Horas



Cisne Negro



Bravura Indômita



O Vencedor



Minhas Mães e Meu Pai





Inverno da Alma



Comentários: Discurso do Rei havia ganhado prêmios como o PGA, DGA, SAG e não sairia sem esse prêmio. É uma pena, mas já era esperado. O grande momento da vitória foi no discurso de um dos produtores agradecendo seu namorado pelo apoio.



Quem deveria ter ganhado: A Rede Social.

Qual seria meu voto: Cisne Negro.

Quem merecia ter sido indicado: Atração Perigosa, Rabbit Hole e Blue Valentine.

23 de fevereiro de 2011

Justin Bieber: Never Say Never (2011)

Com uma carreira musical nova, mas de evidente estouro, o cantor Justin Bieber poderia ser citado como o Crepúsculo da música atual. O único fator que diferencia os dois é que Justin é realmente um astro e tem um talento nítido enquanto Crepúsculo é uma febre que passará dentro de alguns anos. É notável, por exemplo, que o cantor pop tenha começado a ganhar fama através do simples advento da internet - mais precisamente do Youtube. Foi assim que Bieber começou aos poucos se tornar uma verdadeira febre na música atual e arrastar milhares de adolescentes apaixonadas para seus shows. O grande ponto é que o artista tem apenas 16 anos. Têm problemas como todos os jovens possuem, tem seus momentos de raiva, começou a ter fama muito cedo, tornou-se um símbolo sexual para muitas adolescentes, mas o fato é que ainda sim o cantor é apenas um adolescente. Jon Chu merece palmas por ter visto isso e mostrar não só o lado das fãs gritando apaixonadas pelo astro teen ou o tipo de cabelo que ele usa, Chu mostra o lado familiar, o lado altruísta e o mais importante: o lado humano.



Dirigido por Jon Chu ( o mesmo dos desastrosos Step Up), o documentário centra-se na vida de Justin Bieber e mostra detalhes de sua carreira, mostrando suas primeiras aparições desde fotos de familia até primeiros vídeos e como o astro conseguiu alcançar o sucesso.


É muito bem pensado por Chu que o filme começe e guie o espectador não apenas através de um show que iria levar as fãs do cantor para o cinema, mas ao mesmo tempo investir no documental mesmo, nas realizações, nas primeiras afirmações. É muito bem articulado, portanto, que o cantor seja mostrado através de videoclipes como uma criança, logo nos primeiros minutos do filme, lembrando o garoto que começou sua carreira através de videos disponibiliazados na internet.


Chu acerta desde sua primeira cena. Além de colocar videos do cantor como criança tentando tocar seus primeiros acordes de violão, o diretor aumenta a carga emocional da obra em vários momentos. O carisma daquela criança de apenas 6 anos que começa a bater em cadeiras e há mostrar um ritmo considerável, chegando aos 10 anos como bateirista em um evento de Jazz é muito bem montado.


É para ser considerado também a passagem do cantor por uma adolescente tocando violino no antigo ponto em que ele tocava. A cena mostra-se tocante em mostrar a emoção da menina que ouve elogios do astro e contrasta com o belo altruísmo que Elvis, por exemplo, possuía em dar carros e dinheiro para transeuntes.


É interessante comparar com o apelo do Rei do Rock porque esse parece ser o mesmo sentimento de Chu com sua obra: guiar o espectador por momentos da vida de um dos “Reis do pop”. É notável, portanto, que Chu procure evidenciar esse momento e ao mesmo tempo a preocupação do astro em levar uma vida normal, ficando quase impossível pela fama. A comparação com Elvis também surge no apelo do astro com as mulheres e finaliza numa cena maravilhosa em que Bieber começa a passar pelos corredores do Madison Square Garden e anda pelos mesmos corredores que astros inesquecíveis como Elton John, Michael Jackson e o próprio Elvis Presley passaram. Veja como o diretor passeia pelos mesmos corredores, através de Bieber, e consegue mostrar as fotos desses artistas na parede. Mostrando que seu astro atingiu o que ele queria.


Outro fator positivo do documentário é o contato com o público. É emocionante ver as fãs ganhando ingressos do agente e da mãe do astro de forma gratuita. Não é o gesto que emociona, apesar de ser notável, mas a reação das fãs que nos mostra toda a sensibilidade que o longa quer passar. Sensibilidade que também é mostrada de forma muito coesa em inclusões de fotos durante o show que passa pelo espectador e nos tweets do astro para as fãs. É um outro fator instigante da obra: as redes sociais. Desde momentos em que o youtube é mostrado e seus comentários em tela até as mensagens mandadas para Justin pelos fãs e entrando na tela de maneira irresistível.


É uma pena que Chu seja um pouco covarde na escolha de guiar a trama a partir do segundo ato de maneira inteiramente marqueteira. Veja, por exemplo, que o astro parece não ficar nunca bravo e que não tem grandes problemas há não ser uma infecção nas cordas vocais mostrada por um instante. O lado adolescente de Justin é salientado poucas vezes, com destaque na cena em que o astro visita sua cidade e é mandado arrumar a cama. A profundidade que os problemas de um jovem astro poderia demonstrar geraria um conceito muito interessante, mas os realizadores acabam criando um universo linear e salientando um marketing ainda maior. É por isso que a fala dos envolvidos no final do longa dizendo “que não fazemos isso pelo dinheiro” é extremamente hipócrita e desconcertante.


Guiando através da emoção de todos os envolvidos, mostrando belos sentimentos dos pais do protagonista e surpreendendo pela maneira em que é conduzida a narrativa, Chu acerta pela primeira vez em sua carreira. Contando com o carisma de Bieber frente às cameras e com momentos muito elegantes, Chu nos leva para um mundo que não só fãs do astro irão gostar de presenciar, mas pessoas que não têm a minima noção de quem é Justin Bieber poderão apreciar a obra também. E isso Crepúsculo algum jamais conseguiu.


(3 estrelas em 5)

9 de fevereiro de 2011

Lixo Extraordinário (2010)

Em 2002, Eduardo Coutinho lançava seu aclamado documentário Edifício Master que oferecia uma proposta simplíssima – conhecer as pessoas que moravam naquele prédio do Rio de Janeiro, suas neuras, problemas, experiências e o mais importante: como foram parar naquele apartamento. Coutinho surpreendia em sua linguagem por buscar o lado humano, fazendo quase um trabalho jornalístico e explorando as diversidades que podemos encontrar em um único local.




A produção brasileira e inglesa, Lixo Extraordinário, nos apresenta em tela a mesma proposta, fugindo do lado de conscientização por muitos momentos e nos apresenta personagens que acabam mostrando o quão somos preconceituosos e não lidamos com coisas simples da vida: ouvir o que o outro tem a falar. O documentário nos mostra pessoas incomuns e estimulantes. O “lixão” pode ser um lugar de um povo sofrido, sem estudo e de aparência precária, mas também é um lugar humano e de muito aprendizado.



Produzido pelos diretores brasileiros João Jardim e Karen Harley e dirigido pela inglesa Lucy Walker, Lixo Extraordinário relata o trabalho do artista plástico brasileiro Vik Muniz com catadores de lixo em um dos maiores aterros sanitário do mundo, localizado no Jardim Gramacho. Vik mostra o seu encontro com sete trabalhadores do aterro, suas histórias e como uma simples transformação pode mudar a vida dessas sete pessoas.



Contando com o carisma de Vik Muniz, aqui o nosso guia pelo mundo que vamos adentrar, o filme já acerta em sua montagem inicial colocando uma cena em que Vik vai ao talk show “Programa do Jô” e mostrando a partir daí qual a proposta que os envolvidos tem para o projeto e os rumos que irão tomar. É no minimo hilário a chegada de Vik no aterro, onde um personagem surge dizendo que “o bom é que nós nos acostumamos com o cheiro” e o artista logo responde “claro, já me sinto em casa”.



O timing verdadeiro e natural de todos os envolvidos do projeto é excelente, desde Vik e Fábio até quem entra no projeto mais pra frente ou quem aparece em uma pequena cena, como é o caso de Valdir – “99 não é 100”. O ritmo que a diretora Lucy Walker dá para o projeto colabora com isso e mostra em posições inusitadas cenas hilárias e com sentimento. Um grande exemplo é a cena em que a diretora usa uma abordagem um pouco intrigante – usando a câmera quase na vertical em queda – e mostra a conversa de Tião com outra personagem falando da mudança de vida que tiveram com Vik e como as pessoas passaram olhar diferente para eles.



Aliás, sem as pessoas escolhidas para dar vida ao documentário nada seria possível. Tião surge sempre devastador. Desde o momento em que ele é apresentado para o espectador, ficamos com a impressão de que aquela pessoa é dinâmica, carismática e brincalhona, alguém que queremos por perto. Vik e Lucy acertam em colocá-lo como o principal de seu documentário e nos guiam sempre com competência, através do olhar de Tião. Veja, por exemplo, quando Tião vai para Londres conhecer o museu onde um dos quadros será leiloado e começa a verificar com Vik outras obras de arte, guiando não só Tião por aquele mundo que muitos não conhecem, mas o próprio espectador.



Não só Tião, mas todos os escolhidos para fazerem parte da proposta são bem acertados. Somos surpreendidos assim como eles através do longa e também transformados por suas histórias de vida. A naturalidade de cada um deles ao contar as histórias que os cercam é muito impressionante. Em um determinado momento, uma delas fala: “Tenho que criar meu filho sozinho, o pai não pode fazer nada. Trabalha na boca de fumo.” As histórias são bem escolhidas e um destino melhor para cada um deles passa a ser torcido pelo próprio espectador.



Por fim, é interessantíssimo que dois dos indicados a melhor documentário falam sobre arte. Algo que começa com uma proposta encontra outra totalmente diferente e bem mais tocante. Vik constrói em suas obras algo maravilhoso não só de olhar, mas de viver a experiência. Cada momento que passamos com aquelas pessoas é importante, cada uma tem seu significado, o resultado de cada arte é esperado tanto por eles quanto por nós. Queremos o sucesso de todos, tanto de Vik quanto o de Tião e cia. Assim, é maravilhoso ver a montagem final do longa, onde somos apresentados para uma nova entrevista no “Programa do Jô” e onde realmente a mensagem é passada: “o que era algo de uma pessoa no começo, virou um projeto de muitos”.



(5 estrelas em 5)

8 de fevereiro de 2011

Bravura Indômita (2011)

Em 1968, o best-seller de Charles Portis, True Grit, teve sua primeira publicação – contava a história de uma menina de 14 anos que buscava vingança pela morte do pai com a ajuda de um federal e um Texas Ranger. O livro teve uma recepção tão favorável em crítica e público que em 1969, John Wayne, lançava o filme que levava o clássico de Portis para as telas.

Recepção favorável... Não é um fator que os Coen estão acostumados a ter. Criando obras com um humor ácido, pertinente e por muitas vezes brincando com estereótipos, os irmãos Joel e Ethan conseguem proporcionar um tipo de cinema raro, obras que são quase uma poesia técnica e de muito significado.

True Grit mantém a mesma fórmula usada pelos irmãos em muitas de suas produções – o estereótipo, a ação, o tipo de cenário e uma viagem pela proposta que o filme tem interesse em analisar. Se em Um Homem Sério foi o questionamento da vida, aqui os Coen mexem com o fator que move a sociedade: o dinheiro.

Escrito e dirigido pelos irmãos Ethan e Joel Coen, baseado na obra de Charles Portis, o filme conta a história da menina de 14 anos Mattie Ross que chega ao Forte Smith, no Arkansas, em busca do covarde Tom Chaney, que teria matado seu pai por duas barras de ouro antes de se embrenhar por território indígena. Para conseguir perseguir Chaney e o ver enforcado, Mattie procura a ajuda de um homem conhecido como o mais cruel federal da cidade – o impulsivo Rooster Cogburn, que, depois de muitas objeções, concorda em acompanhá-la. O bandido também é o alvo do policial texano Laboeuf, que quer pegar o assassino e o levar ao Texas por uma boa recompensa.

É interessante quando levamos à nossa mente imagens, diálogos e cenas que foram passadas em qualquer filme dos irmãos Coen. Sempre bem construídos, os diálogos conseguem ter o tempo correto em cada cena passada em tela, o que acaba ajudando o próprio timing dos atores e a construção de seus personagens.

Um grande exemplo é a garotinha de 14 anos vivida pela impecável Hailee Steinfeld e que serve como nossa guia para a história que se passa. Nós vemos quase que a obra inteira por seus olhos e seus ideais. Preste atenção na cena em que ela conversa pela primeira vez com Cogburn – somos guiados por ela até uma porta de um banheiro onde o personagem de Bridges começa a dialogar e salientando a demora que levará o que ele foi fazer ali. Em nenhum momento o personagem é mostrado nessa cena e só acompanhamos o diálogo hilário e, já, a ótima química que começa a se estabelecer dos protagonistas do passeio que iremos enfrentar.

É impressionante a confiança e o brilhantismo dos Coen nesse trabalho. A apresentação de Cogburn para o espectador só acontece quando o mesmo é apresentado através dos olhos da Mattie. Veja, por exemplo, a magnífica cena do interrogatório. A cena começa com a personagem entrando no ambiente meio receosa do que irá ver e começa a fazer uma aproximação devagar até ver por completo o personagem de Bridges. A câmera, nessa cena, começa mostrando a parte de trás das vestes formais das pessoas presentes no interrogatório, mostrando sinais de que o personagem de Cogburn estaria sendo cercado por essas pessoas. Bridges só vai ganhando forma aos poucos, conforme a personagem de Steinfeld vai se aproximando. Os Coen fazem uma aula de apresentação de personagem e já mostram qual será o destino do próprio personagem no final da obra. Note o sol presente nas costas de Cogburn o tempo inteiro e o desconforto que isso dá no personagem.

A aula de diálogos dos Coen também é um show à parte, trazendo amostras do que acontecerá no próprio filme e brincando com as referências e estereótipos dos personagens. Frases como: “Texas Ranger, seu jeito pode até ser arrepiante lá em sua terra, mas aqui pode gerar graça”, “Não preciso comprar Uísque, sou policial, eu confisco” ou “Uma mulher divorciada falando em decência” são hilários e brilhantes. Sempre ministrado pelo timing excepcional de todo o elenco.

Aliás, a segurança dos atores e naturalidade em que saem os diálogos eleva ainda mais a obra. Jeff Bridges está fantástico dando verdadeira bravura ao seu personagem (com o perdão do trocadilho), conferindo uma voz mais arrastada – quase inaudível, parecendo que o personagem está sempre bêbado e relembrando seu personagem de Crazy Heart, criando um personagem carismático, sujo e sincero.

Criando uma personagem forte, sólida e que não se intimida Hailee Steinfeld é um achado. Mostrando aspectos sutis da personagem em todas as cenas e diálogos, fica responsável por conduzir o espectador por aquele mundo e explorar o que aquela terra tem para oferecer. Veja, por exemplo, a cena em que somos apresentados a personagem Mattie, logo depois da morte de seu pai e a personagem pergunta: “Por que é tão caro um caixão? O espírito já se foi.” Em contrapartida, a personagem negocia a vingança de seu pai, não mais se preocupando com o dinheiro, mostrando o que realmente importa para Mattie. Ao passo que Matt Damon transmite a competência de sempre.

O trabalho do diretor de fotografia Roger Deakins, que já havia trabalhado com os Coen em “Um Homem Sério” e “Onde os Fracos não têm vez”, também é brilhante. Aqui, empresta sua qualidade de mostrar os cenários de faroeste com competência e brilhantismo. Deakins em muitos momentos prioriza uma lente grande angular, mostrando todo o cenário – belíssimo trabalho de Dechant – em tela e colocando os personagens cavalgando ao longe, sem grandes iluminações e dando mais atenção para o ambiente em que se situam.

Se em 1969 achávamos que John Wayne havia chegado lá, em 2011 ficamos com a impressão que não. O verdadeiro trabalho a ser considerado é essa nova obra-prima que os Coen apresentam. Os irmãos que sempre prometem trazer um cinema diferente, onde as piadas são sempre inteligentes, onde o clima de brincadeira está presente em muitos momentos, onde os diálogos constroem personagens com um brilhantismo natural. Se você não notar isso, pegue apenas um dos melhores diálogos do filme e veja a proposta, o significado e o que será o destino dessa frase. Tudo tem um propósito. E quando a nossa linda protagonista pergunta para Cogburn “Tu não vai enterrar ele?” e o personagem de Bridges responde que “O chão está congelado. Se quiser um enterro digno tem que morrer no verão”, aí que sabemos: vimos um filme dos Coen em que uma única frase pode revelar tudo.

(5 estrelas em 5)

7 de fevereiro de 2011

O Vencedor (2010)

David O’Russel tem obras significativas em seu currículo, onde contrasta situações atuais com mensagens pertinentes. Em um de seus primeiros longas, o diretor criou uma obra que envolvia incesto e que colocava a prova o quão confuso pode ser um sentimento. Acabou saindo do cinema independente para aventurar-se no cinema norte-americano em 1999, com o polêmico “Três Reis” e finalmente foi ao fundo do poço com seu “Huckabees – A Vida é uma comédia” onde, depois de ter explosões com atores que dirigia, foi descartado pelos estúdios. Parecia ter chegado ao fim sua carreira.

É interessante falar isso, pois tanto o título original desse excelente filme quanto à tradução do título para português reflete a situação de cada um dos envolvidos. Desde os personagens e as situações enfrentadas até a vida pessoal de seus idealizadores. O’Russel, aqui, consegue passar cada etapa do árduo e exaustivo trabalho para como chegar lá, levando toda sua experiência de luta para dentro de uma obra que se mostra simples, mas com uma absoluta honestidade.

Escrito por Scott Silver, Paul Tamasy e Eric Johnson, o filme conta a história de Dicky Ecklund (Christian Bale) e Micky Ward (Mark Wahlberg). Dicky é uma ex-lenda do boxe que desperdiçou o seu talento e a sua grande chance. Agora, o seu meio-irmão Micky Ward tenta se tornar uma nova esperança de campeão e superar as conquistas de Dicky. Treinado pela família e sem obter sucesso em suas lutas, Micky terá que escolher entre seus familiares e a vontade de ser um verdadeiro campeão.

Mostrando o seu brilhantismo desde os primeiros minutos, O Vencedor é uma obra muito mais complexa e significativa do que aparenta ser. O’Russel já nos mostra na seqüência inicial o ambiente da história que virá a seguir e a situação em que os personagens se apresentam. Micky aparece asfaltando a rua enquanto Dick sempre se move de costas, buscando as atenções da câmera e relembrando seu passado e momento glorioso na luta contra Sugar Ray. Note sempre como o personagem de Wahlberg move-se para frente enquanto o irmão insiste em olhar pra trás, evidenciando os caminhos opostos que os dois vivem.

O diretor ainda acerta em cheio ao sempre conduzir a câmera circularmente, envolvendo o espectador no ambiente familiar e aproximando ainda mais a câmera em certas situações. Note como a câmera é colocada quando Micky está conversando com um possível empresário e O’Russel move sua câmera em direção à Dicky e Alice mostrando suas reações e preocupações com a proposta que o personagem de Wahlberg está ouvindo. Logo depois, a câmera se move com extrema velocidade e começa a circular até vermos apenas Micky, mostrando que o que importa para o espectador é apenas aquela situação e devemos nos preocupar é com Micky, pois ele é o foco das atenções. Brilhante!

A família, aliás, é um dos grandes ganchos que o filme se propõe a discutir. A instituição e o quanto ela pode afetar decisões, negócios e possivelmente o destino de cada um. Para a personagem de Alice, apenas a família é o que importa. Quando é confrontada por outros personagens sobre o destino do filho e as escolhas que poderão dar outras oportunidades só que com outros empresários, a personagem limita-se a dizer: “Eu conheço as pessoas, quem se preocuparia mais com Micky do que sua própria família?”

David O’Russel explora ainda mais esse universo familiar complicado e que pode oferecer diversas rupturas em seu caminho. O diretor desenvolve esse laço de uma forma impressionante. Veja como o vinculo familiar é demonstrado de forma espetacular em duas cenas envolvendo uma ligação. O diretor consegue demonstrar o vínculo familiar através da extensão do telefone. Na primeira cena, temos a personagem Alice decidindo uma próxima luta para seu filho – Micky – e tentando manter a instituição familiar firme mesmo diante do desequilíbrio. Na outra cena, Micky é mostrado com seu telefone, onde a câmera mais uma vez realiza uma passagem por sua extensão culminando finalmente no reencontro com Charlene e Micky desligando a extensão, quebrando o vínculo familiar que era mantido. Arrepiante!

Aliás, Charlene é uma das grandes responsáveis pelo começo do destino vitorioso de Micky. Sempre demonstrando personalidade diante das situações em que vive ou nos convívios que passa a ter, Amy Adams oferece a personagem uma segurança impressionante, lutando para ser alguém e ter sua vitória também através do personagem de Wahlberg. Um grande momento de sua personagem é quando ela vai até a sacada e vê Dicky seguindo em frente e voltando aos treinos. Ao invés de parar o personagem, ela simplesmente não fala nada e deixa Micky seguir o caminho vitorioso que virá. Olhe também a cena em que ela vai com Micky confrontar a família e tentar um novo rumo para sua vida, Amy Adams funciona perfeitamente como o porto seguro do personagem, envolvendo-se no braço de Wahlberg e servindo como apoio diante daquela situação.

Em contraponto ao personagem de Adams, surge a brilhante Melissa Leo sempre procurando estabelecer um equilíbrio para a instituição familiar e permanecer fria em situações que parecem ser trágicas. Leo consegue manter frieza e calma em qualquer situação que parece danificar o futuro que ela queria ter alcançado para todos. É tocante ver a primeira cena em que ela finalmente desaba vendo a vida que Dicky leva e que nunca mudará do jeito em que está. Um sorriso envergonhado do espectador – na cena em que Bale procura fugir da mãe pela janela –, acaba virando um mar de lágrimas em uma cena devastadora dentro do carro, onde é cantada a música I Started a Joke pelo personagem de Bale.

Aliás, as músicas escolhidas por Michael Brook para compor a obra refletem totalmente em cada momento e sentimento vivido por seus personagens. A cena do carro é mostrada de uma forma impressionante ao ressaltar a sintonia em que estão os personagens – como se a música fosse um grito de socorro e arrependimento proporcionado pelo personagem de Bale. Ao passo que Here I Go Again reflete perfeitamente a situação que Wahlberg vai enfrentar junto com seu irmão – caminhando sozinho, contra todas as especulações e contra toda a multidão.

A obra ainda conta com a excelente montagem de Pamela Martin que consegue passar cada etapa do treino árduo e que mostra um ritmo e dinamismo impressionante. Conseguindo manter o dinamismo, sem soar forçado, nas lutas que o personagem começa a encarar. O momento em que Micky vê o seu adversário e a mudança para o vestiário é montado de forma muito competente. Ao passo que as montagens envolvendo os treinos de Micky tentando voltar a vencer e Dicky tentando dar a volta por cima são brilhantes.

Christian Bale como Dicky Ecklund é algo extraordinário. Postando uma voz extremamente rouca, uma aparência magérrima e sempre encenando apenas seus momentos de glória, Bale cria um personagem extremamente complexo e ao mesmo tempo carismático. Mesmo deixando claro seu defeito como ser humano, o personagem de Bale impressiona por manter o carisma até em situações trágicas. É extremamente importante, aliás, que Bale consiga produzir essa sensação de preocupação com seu personagem, pois a influência que isso adquire e abala o espectador no documentário é tão devastador que parece que freqüentamos a mesma família do personagem.

Criando um personagem completamente diferente de seu irmão desde o começo do filme e que tenta trilhar seu próprio caminho, Wahlberg é um complemento honesto, contido e verdadeiro para o filme. Dominando seu personagem já em suas primeiras cenas, ele procura sempre sentar um pouco distante de seus familiares, mostrando que apesar de pertencer àquele meio já não se sente mais tão influenciado por eles, o que se mostra na cena seguinte em que Micky encontra seu porto seguro nas mãos da deliciosa Amy Adams.

Quase sempre auxiliado pela direção perfeita de O’Russel, Wahlberg surpreende também na seqüência do cinema. Começando a brincar com estereótipos até a cena em que o personagem se mostra envergonhado e a câmera passa a mostrar o personagem através da janela, sem a intimidade que era vista durante maior parte do filme.

Mostrando-se extremamente confiante, David O’Russel explora por completo as atuações de seu excelente elenco e nos guia por toda a trajetória que enfrentaríamos e enfrentamos. E se em seus primeiros minutos o diretor mostra os personagens caminhando completamente opostos, em seu final, passa a mostrar os dois personagens em perfeita sintonia caminhando em frente, cheios de motivações e aspirações. Talvez esse também seja o sentimento de seu realizador que proporcionou uma perfeita sintonia com o público em seu projeto e merece o reconhecimento que adquiriu.

(5 estrelas em 5)