22 de março de 2011

Prêmio Kino Brasil (Melhor Filme)

O Prêmio Kino Brasil foi criado por Armando B. Martins que escreve no Listas de 10 e Vítor Stefano que escreve no Sessões. A premiação visa espelhar a opinião da geração de blogueiros brasileiros sobre o cinema nacional, fazendo uma espécie de colegiado de blogueiros, que vota em categorias para escolher os melhores filmes nacionais do ano. Os primeiros indicados a premiação já foram escolhidos e eu – um dos votantes – consegui emplacar alguns dos melhores nomes em longa-metragem nacional.


Farei uma rápida análise sobre cada um dos indicados ao Melhor Filme Nacional com breves comentários:



Os Famosos e os Duendes da Morte de Esmir Filho


Um dos meus filmes favoritos de 2010 e o segundo melhor filme nacional do ano. O filme é muito bem explorado por Esmir Filho que consegue criar um retrato de melancolia e completa solidão não só através de seus planos bem construídos, mas principalmente pela ótima fotografia e direção de arte. A cena inicial reflete muito bem isso, mostrando o personagem, interpretado intensamente por Henrique Larré, sentado no escuro de seu quarto acendendo/apagando um abajur e mostrando através da escuridão que ele seria apenas um ponto iluminado num completo vazio. A obra de Esmir Filho consegue ser intimista no ponto certo e muitos adolescentes podem se identificar com o personagem de Larré – simplesmente pela natureza depressiva do garoto e seu escape pelo mundo da música e seu “eu virtual”.

* O filme também é indicado em Melhor Roteiro e Direção


Os Inquilinos de Sérgio Bianchi


Bianchi é um dos melhores nomes do nosso cinema, mas é um dos menos conhecidos. O diretor faz o seu sexto longa-metragem e não perde a postura fazendo um dos melhores filmes brasileiros lançados em 2010. Conhecido por suas temáticas que tentam causar reflexões sobre algum tipo de caos social ou longas-metragens que poderiam virar reportagens jornalísticas – pelo tema e resultado de algumas de suas obras mais pertinentes –, Bianchi explora em Os Inquilinos uma trama mais simples, porém com o mesmo discurso social visto em seus filmes. O tópico da vez é a segurança ou a falta de. Se pegarmos apenas a sinopse do brilhante filme de Bianchi temos:Ele não tem uma arma, tem uma filha e um filho pequeno, fica fora o dia inteiro, não vê o que se passa na rua, ouve o que a mulher diz, o que a rua diz, ouve o barulho da música e das risadas dos inquilinos de madrugada. E não consegue dormir.” É isso que o diretor traça: o quanto a insegurança pode ter influência em suas decisões e suas conseqüências. Valter é interpretado muito bem por Marat Descartes que consegue justamente mostrar esse lado, o sutil modo de ser “mandado” ou “domesticado” pela violência e suas vertentes. A famosa insegurança que não atinge só seus personagens, mas o espectador.

* O filme também é indicado em Melhor Roteiro e atriz coadjuvante


As Melhores Coisas do Mundo de Laís Bodansky



O único filme que vi da diretora foi o ótimo “Bicho de Sete Cabeças” – fascinante principalmente por suas atuações. Aqui, Bodanzky revela-se uma boa escolha para uma história basicamente simples, mas que mais uma vez busca o algo a mais nas atuações dos envolvidos, talvez evidenciando o bom trabalho de atores feito pela diretora. O grande erro do longa é a saída mais fácil buscada no terceiro ato. A diretora se acovarda em dar um destino final justo e mais impactante para um dos personagens e faz um clima amistoso demais para o que o resto do longa-metragem havia proposto – quase um banho de água fria no espectador. Porém, o lado adolescente retratado pela diretora nos dois primeiros atos do filme são sublimes. As brincadeiras de colégio, a paixão pela guria mais linda do colégio e que nunca lhe dará bola, as amizades importantes, os falsos amigos, o poder dos rumores, etc. Tudo é muito bem planificado por Laís que dá enquadramentos precisos em mostrar cada aspecto emocional que o personagem sente no momento. Note, por exemplo, a cena em que “Mano” olha para “Valéria” pela primeira vez no colégio. A cena mostra uma feição diferente proporcionada por Miguez e logo depois a diretora faz quase que um contra-plongée para mostrar um sonho distante do personagem. Além disso, a arte (tanto o teatro, como a música) é a grande atenção da narrativa, servindo de escape de um mundo difícil e turbulento para o uso das palavras e emoção. Os personagens de Miguez e Fiuk (ambos brilhantes, principalmente o 2º) mostram muitas de suas emoções por ali: em uma peça ou em uma música. É chegando nesse patamar altíssimo que a obra se entrega a uma trama covarde e reverencia o caminho mais fácil, menos perigoso, em um final que tinha tudo para atingir algo marcante. Uma pena!

* O filme também é indicado em Melhor Roteiro, Direção, Atriz Coadjuvante e Ator


Tropa de Elite 2 de José Padilha 



José Padilha é o diretor mais promissor da nova leva de cineastas brasileiros. Cada cena da seqüência do ótimo e polêmico primeiro filme é administrada de forma muito mais pertinente por seus realizadores, cada plano e cada seqüência causa tensão. Desde um confronto mínimo contra jornalistas curiosos demais até as “brincadeiras” que Rezende faz de forma sublime com a montagem do longa – acabando com o espectador já na cena inicial, onde deixa o público temeroso quanto ao destino do personagem de Moura, encurralado. O longa funciona quase como que uma orquestra, onde cada instrumento tem que tocar em sintonia e nesse quesito Padilha sai-se admiravelmente bem ao conduzir os melhores instrumentistas do país (Rezende, Carvalho, Kopke, etc.) e dar toques singulares a uma obra que atinge o patamar de um dos melhores filmes nacionais já feitos. Padilha é tremendamente competente ao conduzir planos seqüência geniais, como o que Nascimento pega uma gravação que incriminaria uma boa parte dos políticos brasileiros, passa por portas de segurança em posse da gravação e pelo secretário que acaba sendo automaticamente seguido por Padilha, passando pelas mesmas portas de segurança e descobrindo o destino da fita. Um dos melhores planos seqüências que vejo em muito tempo. É interessante também o contraste com a realidade que o roteiro escrito por Padilha faz – algo que se revela um duro “soco no estomago” do público, ao mostrar situações em que nosso cotidiano é retratado na tela em sublinhas. Contando com atuações brilhantes e uma composição mais que genial de Wagner Moura, Tropa de Elite 2 é um achado do cinema nacional que pode finalmente fazer muitos brasileiros voltarem suas atenções ao cinema nacional e principalmente a perfeição que esse novo cinema pode atingir. Perfeito!

* O filme mais indicado da premiação. Indicado em Melhor Roteiro, Direção, Ator e Ator Coadjuvante (2 vezes).



Obs. Não listei o filme “Viajo Porque Preciso, Volto porque Te Amo” por não tê-lo visto e não seria justo com o longa que está indicado em outras 2 categorias – o que provavelmente já o torna bom, mas não opinarei.

Ah sim, todos os indicados estão nesse link: http://www.kinobrasil.com.br/p/os-indicados.html

14 de março de 2011

Analisando o Oscar: Melhor Diretor

Na categoria de direção fomos pegos de surpresa por uma vitória quase que absurda de Hooper. Foi a categorias com mais diferenças entre os realizadores: um diretor que priorizou o convencionalismo, outro que produziu um retrato de uma geração, dois que melhoraram algo que já era ótimo, outro que tem uma volta triunfante em um filme que tem suas singularidades em um gênero que já tentou de tudo e um diretor que já nos havia oferecido quatro filmes primorosos e agora chega a perfeição.

Minha rápida análise dos indicados a melhor direção:



5 – Tom Hooper por O Discurso do Rei


"Não deveria estar aqui".


Tom Hooper é um diretor com muito potencial, porém foi premiado no momento errado de sua carreira – algo que trouxe muita raiva para sua pessoa e futura filmografia. O que se mostra uma pena, levando em conta que O Discurso do Rei é um filme no mínimo interessante, tanto do ponto de vista técnico quanto do narrativo. Desde seu filme “Maldito Futebol Clube”, Hooper prioriza uma vertente narrativa, a qual trará o poderoso clímax final, mas nem por isso se priva de mostrar outras vertentes ou outros transtornos durantes seus longas. Hooper se mostra um diretor centrado no óbvio e no convencional, mas que exerce a função de forma extremamente precisa. Além de claro, mostrar-se um excelente preparador de elenco ao nos proporcionar atuações singulares de seus atores. Michael Sheen, Colin Firth e Geoffrey Rush são exemplos escancarados de que o diretor sabe preparar um elenco vencedor, mas que não se permite fugir muito da idéia central. Em O Discurso do Rei, o trabalho de câmera de Hooper não chama atenção em muitas cenas, contando mais com o trabalho do diretor de fotografia Danny Cohen nas cenas em que focaliza com precisão o microfone em que o rei fará os discursos, mostrando justamente que a história se passará em função de um único objeto. Na cena seguinte quando o personagem de Firth irá fazer um discurso para centenas de pessoas, mais uma vez a câmera focaliza o microfone deixando o público desfocado, algo que reforça a sensação de náusea do protagonista em discursar para a multidão. Hooper não é um charlatão, muito menos um diretor que será esquecido daqui a alguns anos, não, ele é apenas um diretor que se beneficiou pela forte campanha da companhia Weinstein, algo que poderia favorecer qualquer outro.



4 – David Fincher por A Rede Social

Quando me darão o Oscar?


David Fincher é o diretor de Alien 3, Se7en, Vidas em Jogo, Clube da Luta, O Quarto do Pânico, Zodíaco, O Curioso Caso de Benjamin Button e agora Rede Social. Só por ter dirigido Clube da Luta, Fincher deveria receber menção honrosa em todas as premiações do globo, incluindo Miss Universo. Fincher é um diretor com um estilo de abordagem singular e que prioriza um roteiro que por muito foge do convencional. É exatamente o motivo de “A Rede Social” funcionar. O diretor consegue criar um fluxo narrativo invejável ao mostrar cada dialogo ou cada aspecto emocional do protagonista e das pessoas que fizeram parte desse projeto que trouxe a maior rede social da internet e a mais rentável do mundo. A passagem de câmera de Fincher funciona perfeitamente com os diálogos rápidos e pertinentes de Sorkin e também com a brilhante montagem de Kirk Baxter e Angus Wall. Em Rede Social, o diretor acerta mais uma vez, criando um paralelo entre poder e solidão – mostrado na devastadora cena final em que o criador da maior rede social do mundo espera a confirmação de uma única pessoa. Fincher conseguiu mais uma vez!



3 – Ethan Coen e Joel Coen por Bravura Indômita

"Já ganhamos isso aí."


Bravura Indômita é apenas a prova irrefutável do talento dos Coen em construção de diálogos e condução de histórias. É interessante quando levamos à nossa mente imagens, diálogos e cenas que foram passadas em qualquer filme dos irmãos Coen. Sempre bem construídos, os diálogos conseguem ter o tempo correto em cada cena passada em tela, o que acaba ajudando o timing dos atores e a construção de seus personagens. Veja, por exemplo, a magnífica cena do interrogatório. A cena começa com a personagem entrando no ambiente meio receosa do que irá ver e começa a fazer uma aproximação devagar até ver por completo o personagem de Bridges. A câmera, nessa cena, começa mostrando a parte de trás das vestes formais das pessoas presentes no interrogatório, mostrando sinais de que o personagem de Cogburn estaria sendo cercado por essas pessoas. Bridges só vai ganhando forma aos poucos, conforme a personagem de Steinfeld vai se aproximando. Todas as cenas que os Coen proporcionam são sutis, plásticas e com uma genial sátira de seu ambiente ou de seus próprios personagens. Guiar o espectador apenas do olhar da personagem de Steinfeld é de uma genialidade assombrosa. Todas as cenas têm algum significado que se não for mostrado de imediato, será mostrado ao final. E é quando a nossa linda protagonista pergunta para Cogburn “Você não vai enterrar ele?” e o personagem de Bridges responde que “O chão está congelado. Se quiser um enterro digno tem que morrer no verão”, aí que sabemos: vimos um filme dos Coen em que uma única frase pode revelar tudo.



2 – David O´Russel por O Vencedor

"Estarei de volta nos próximos anos"


O’russel tem o pior trabalho dos cinco diretores, construir algo único de um tema abordado inúmeras vezes e é exatamente isso que o diretor consegue e é exatamente esse o porquê de estar em segundo lugar da minha lista dos melhores indicados ao Oscar. O diretor simplesmente investe no tema família e tudo que essa “instituição” pode causar em um único esporte, desde os momentos de glória aos momentos desastrosos de um lutador. O que gera um negócio familiar? Essas respostas são as que O’russel quer demonstrar para o espectador no decorrer do longa, para isso o diretor aborda sua narrativa sempre de forma circular e próxima de seus personagens, com o intuito de demonstrar o clima íntimo e familiar dos envolvidos. E se o personagem de Whalbergh está sempre deslocado de seus familiares essa é uma decisão acertada não só de seu ator, mas do diretor que é preciso em mostrar esses momentos. O’Russel também prioriza sua maravilhosa trilha sonora e investe nas músicas cantadas pelo seu maravilhoso elenco. Músicas que entram em total sintonia com o momento que os protagonistas estão passando. Se Bale canta para sua mãe no carro “I Started a Joke”, evidenciando seus erros e que os dois entendem a situação em que se encontram, a mesma análise pode ser feita da entrada para a última luta de Micky e na música “Here I Go Again”, mostrando que mais uma vez aquela família está lá desacreditada e contra tudo e todos. O’russel é inteligente e cumpre bem sua proposta. O Vencedor é uma aula de cinema.



1 – Darren Aronofsky por Cisne Negro

Perfeito!


Darren Aronofsky é um diretor que consegue nos colocar em um ambiente claustrofóbico, inseguro, inquietante e perversamente assustador em todas as suas obras. Todos os seus desfechos são intrigantes e conseguem mexer com cada milímetro de nossa extensão cerebral. Talvez pudéssemos julgar o diretor e o próprio estúdio ao entregar o filme logo em sua sinopse já permitindo o espectador saber o que a protagonista tem de errado e se aquilo tudo é real ou não passa de um transtorno psicótico. Poderíamos culpar se não fosse mostrado o que vimos na tela. Aronofsky começa a fazer um jogo dos sete erros com o espectador e consegue criar algo singular. Em cada aumento de nota do genial Clint Mansell nossas inseguranças e medos aumentam, conseguindo dar ainda mais tensão à obra. Começando o longa com a câmera na mão, Aronofsky investe num clima quase que de perseguição à sua protagonista. Em todo o lugar, a personagem parece ser perseguida por algo e a tensa respiração que ouvimos ou o batimento cardíaco (note que é da própria protagonista) só faz aumentar mais os nossos medos. A genialidade de Aronofsky vai desde o visual único como na perfeição que é a cena final até cada enquadramento ou “brincadeira” que o diretor proporciona em tela para descobrirmos quem é quem. Veja, por exemplo, a cena da balada onde, através de uma fotografia avermelhada, conseguimos visualizar uma das faces de Nina querendo desprender-se de seu corpo. Aliás, o cisne negro também é visualizado nessa cena e por último uma face assustada e presa é vista de relance num enquadramento final – mostrando um fundo todo preto (vazio) e sua face avermelhada e densa. Outro retrato impactante é o “desprendimento” de Lily quando Nina chega a casa no final do segundo ato e para na metade do espelho. O mesmo espelho que serve para mostrar Nina separada (note a divisória do espelho) acaba mostrando Lily se desprendendo do corpo de Nina e dirigindo-se ao quarto. Da mesma forma é quando vemos Nina indo para sua cena final e sua imagem não reflete no espelho em que ela passa. Todas as cenas são cuidadosamente planejadas e o “jogo” de Aronofsky funciona de forma perfeita chegando ao limite cinematográfico na melhor cena que já assisti nas telas de um cinema ao mostrar Nina se transformando em Cisne Negro. E se Tarantino, através do personagem de Brad Pitt, brinca ao final de Bastardos Inglórios dizendo que havia criado sua obra-prima; Aronofsky também brinca com seu longa-metragem ao final, em um dos diálogos mais simples e absolutos que o cinema já presenciou: “Foi perfeito, eu cheguei à perfeição!”