20 de julho de 2014

Até o Fim

All Is Lost, EUA, 2013. Direção: J.C. Chandor. Roteiro: J.C. Chandor. Elenco: Robert Redford. Duração: 106 min.

A solidão num naufrágio pode ser interpretada de diferentes formas, dependendo, claro, da perspectiva que o diretor quer explorar em sua narrativa. Em Até o Fim, portanto, o promissor J.C. Chandor enxerga sua história não como um exame de autoconsciência ou algo do tipo, mas como um teste de sobrevivência para alguém que só pensará nisso no decorrer do longa-metragem.

Assim, quando já iniciamos o filme com o barulho da água do mar batendo no que parece ser os destroços de alguma embarcação e a voz cansada e triste de Robert Redford ressoa pedindo desculpas, num “sinto muito” comovente, apontando que o que lhe resta é apenas um corpo e alma intactos, nada mais, a gravidade da situação nos é apresentada de forma extremamente consciente e instigante. Da mesma forma, o esforço do personagem é sempre mais importante através de seu olhar ao invés de sua voz; sabendo-se disso, o design de som é ainda mais marcante por compreender o completo caos que o personagem vive em alto mar, estendendo o perigo a cada tentativa de escape. Observe, sob esta ótica, o sorriso de Redford ao conseguir consertar o casco de seu barco para depois visualizarmos a tensão no mastro, numa grua que acompanha o seu empenho ao aviso de tempestade no meio do caminho.

E se a edição de som é perfeita em administrar os sons das batidas no casco, o uso de uma corda ou o movimento da vela e a mixagem é impecável em atribuir cada noção específica para o instinto do personagem em perceber o caminho do vento, a direção de Chandor também contribui muitíssimo para a tensão da narrativa. Deste modo, o enquadramento de Redford segurando uma corda e olhando para o horizonte, o seu reflexo numa poça de água que acaba de inundar o seu quarto e a intensidade da cena que o protagonista tenta religar um rádio são cenas interessantíssimas. Igualmente, o cineasta é sutil em ressaltar uma aliança para criar ainda mais empatia ou as feições do ator, que dão ainda mais uma sensação de habilidade e sabedoria. Além do mais, o roteiro de Chandor também merece destaque por concentrar suas forças em contar a tragédia, não o antes e o depois, assim fazendo com que soe como se o próprio sobrevivente a contasse para nós: “Aí acordo com um rombo no meu barco!”.

Ao mesmo tempo, a trilha sonora de Alex Ebert nunca é intrusiva, e, embora possua acordes que tentam trazer um clima épico para a sobrevivência, é sempre administrada conscientemente. O mesmo se pode falar da fotografia de DeMarco, que capta o azul intenso do começo para a atmosfera cinzenta e sem vida que a narrativa passa a requirir. Note que o mar, antes gigante, torna-se opressor, inconfiável, deixando o protagonista à sua mercê. Da mesma forma, o enquadramento que Chandor escolhe para mostrar o distanciamento entre barco e homem é ótimo por nos fazer entrar dentro do bote, como se indicasse o afastamento final – o desprendimento de algo que precisava afundar. E observe que só após o desprendimento que avaliamos o bote salva-vidas de frente.

Contando com uma atuação extremamente concentrada e intensa de Redford, que chega a denunciar as sequelas de tanto tempo sem falar ao religar um rádio e nos oferece uma perda de controle gradativa e verossímil, Até o Fim é um longa-metragem que não se preocupa em mostrar de quem é a mão que se estenderá ao sobrevivente, muito menos em quem é aquele sobrevivente. É uma obra que somente se permite a contar uma história de sobrevivência. E faz com exatidão.

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