27 de outubro de 2016

Mostra de São Paulo 2016– Dias 5, 6 e 7 – 24, 25 e 26 de outubro

Após assistir a filmes bastantes divergentes nos últimos três dias, os destaques ficam por conta do fundamentalismo, a depressão e cicatrizes emocionais presentes em obras francesas e brasileiras. A seguir, as críticas continuam:

20. A Menina Sem Mãos (Direção: Sébastien Laudenbach. França, 2016)

Há uma dança sensível e delicada com as cores e os rabiscos de seu desenho no filme do diretor Sébastien Laudenbach, onde uma história forte sobre uma menina que vira mercadoria de seu pai com o diabo em troca de ouro passa a viver sem as mãos. O diabo quer levá-la com ele, mas a menina, por ser pura, freia as intenções do diabo.

Nesta tradicional história dos irmãos Grimm, Laudenbach aproveita os traços ilimitadores para brincar continuamente com a sua linearidade, tentando não deixar com que o espectador se sinta entediado: assim, o diabo é percebido em múltiplas aparências ou seus personagens podem voar ou ser auxiliados por divindades sem que estranhemos. O cineasta também é eficiente em ressaltar o contraste das cores: o castelo perdendo a cor na ausência da princesa, os ambientes mais vivos quando seus personagens estão apaixonados e assim por diante.

Igualmente, frases como 'como o ouro, eu a quero suja” e“Adeus, já que você não vai com o Diabo” evidenciam certa maturidade. Laudenbach só fica devendo, talvez, na própria linguagem que escolhe contar a história, pois, embora seja ilimitada, não permite que criamos laços completos com aqueles seres – por não aparecerem completamente a nós.

(3 estrelas em 5)

21. Leste-Oeste (Direção: Rodrigo Grota. Brasil, 2016)

Como um velho blues, a pulsação do filme de Rodrigo Grota reside na melancolia, na bebida e na estrada que nos define. Não à toa, os seus personagens são pilotos ou vivem no meio de competições de automobilismos: andando em círculos, Leste-Oeste proporciona genuinamente uma colagem de cenas da vida, onde cabe ao espectador se identificar ou não com cada frase, cada ação e cada instante vivido por pessoas perdidas em suas respectivas realidades.

Ezequiel é o fio que desencadeia as rachaduras numa família que segue enlutada por João, irmão de nosso protagonista, filho preferido e piloto de potencial. Sua morte precoce evoca no ambiente familiar incertezas muito maiores do que aquelas pessoas são capazes de lidar, deixando com que uma voz num rádio ou uma música em alto volume preencha o vazio que eles sentem. Nessa união, a sequência que Stela canta uma música inacabada de João, de sua ex-banda, é uma das mais tocantes de 2016.

Assombrados pelo fantasma do familiar, Stela, Angelo, Ezequiel, Pedro são apenas pedaços atormentados tentando se alimentar de pequenos prazeres. Deste modo, nada mais significativo, que o próprio diretor sublinhe em seu clímax que o silêncio é uma forma de comunicação (“Meu silêncio sempre foi apenas seu!”). Não importa a distância, a estrada é a mesma.

(5 estrelas em 5)

22. 5 Mulheres (Direção: Olaf Kraemer. Alemanha, 2016)

Um final de semana que não sai como esperado, uma morte acidental, a polícia que não é avisada, a tensão entre personagens que passam pela mesma situação – enfim, nada é novo no filme de Olaf Kraemer. A luta do diretor está por sua comédia, que se assume como estúpida para entusiasmar o espectador. É algo que consegue, aqui e ali, principalmente por investir em situações constrangedoras, como as cinco amigas decidirem deixar um estranho, que afirma ser irmão do rapaz assassinado, se hospedar na casa delas, ou as tentativas de esconder o corpo ou as coincidências absurdas.

Olaf não está preocupado com sua mensagem, ele quer nos divertir. Com a câmera sempre próxima dos rostos daquelas mulheres, ele consegue criar empatia o suficiente para nos importarmos com ela e sabermos quem é cada uma, mas a maneira burocrática como lida com todo o resto não perdoa a frustração.

Não sabendo como terminar sua história, algo básico, no fim, a conexão com as amigas não é o suficiente para querermos passar mais um verão com elas. O tempo é curto.

(2 estrelas em 5)

23. The Stopover (Direção: Muriel e Delphine Coulin. França/Grécia, 2016)

A primeira cena do filme das irmãs Coulin já ilustra muitíssimo bem o que estamos prestes a testemunhar: colocando-nos de frente ao olhar de Aurore, a narrativa já assume quem será nossos olhos e ouvidos naquela realidade tempestuosa do pós-guerra. O período se chama Descompressão, que é quando os soldados fazem uma escala num hotel cinco estrelas para extravasar seus tormentos, desabafar sobre suas missões e serem diagnosticados pelo governo se estão aptos ou não para voltar a realidade.

The Stopover segue uma cartilha de filmes que retratam desordens de soldados, após períodos extremos: a tensão com que a violência iminente cresce, por exemplo, faz com que imaginamos que Aurore e Marine estejam em perigo todo o tempo. O trauma está nos detalhes. Está na forma como uma soldada enfia uma faca na boca e começa um vai e vem ou um soldado acendendo um isqueiro sob seu polegar. Na sensação de liberdade ao deixar os aposentos escolhidos pelo governo.

As irmãs Coulin também se interessam na ótica machista presente na corporação e o maior debate do filme reside na ausência da denúncia de abuso por parte de colegas: muitos poderão considerar apenas o choro de Aurore enquanto ouve todos cantando a mesma canção em uníssono uma forma covarde de lidar com a situação. Talvez, não. Porque é exatamente evidenciando as bandeiras franceses no 3D que faz reviver as memórias cruéis da guerra e o símbolo nos seus uniformes que as diretoras trazem o papel do país em permitir que certas coisas aconteçam sob sua tutela. E como chegamos a isso.
 
(5 estrelas em 5)

24. Live Cargo (Direção: Logan Sandler. Bahamas/EUA, 2016)

Tão pálido e sem personalidade quanto sua fotografia em preto e branco, Live Cargo é o primeiro filme do diretor Logan Sandler. E dá para perceber. Procurando não se comprometer em sua mensagem política, ao mesmo tempo que tenta dar uma natureza pretensiosa ao narrar tráfico de pessoas e refugiados, o diretor resolve tudo em seu último ato como quem precisa seguir uma fórmula previsível: a batalha final, o casal feliz pra sempre e uma sensação de recomeço.

A história se passa em um Bahamas consumido por ganância e corrupção, onde um casal de luto se refugia para lidar com seus problemas e se vê diante de uma batalha entre o dono da ilha e um traficante, após o roubo de um barco. Na trama de Sandler, entretanto, as individualidades são ressaltadas por olhares caricatos de maldade ou sofrimento; sem que precise se envolver ou notar quem realmente são aquelas pessoas na tela. Não nos importa. Tudo é construído para dar uma espécie de alumbramento. Culminando num exercício de paciência.

(2 estrelas em 5)

25.Zero Days (Direção: Alex Gibney. EUA, 2016)

Desde sua primeira cena, o novo e perturbador documentário de Alex Gibney sobre um malaware chamado Stuxnet versa perfeitamente com o livro de Glenn Greenwald sobre seu encontro com Snowden – Sem Lugar Para Se Esconder. Evidenciando personalidades públicas que se escondem através de suas pastas confidenciais para fugir da lei, o diretor discorre sobre a falsa sensação de segurança que passamos nos dias atuais, apontando nossa fragilidade cibernética e passividade diante das chamadas guerras silenciosas.

Montando seu documentário entre passagens por códigos que viram notícias ou simulações, em fusões autoexplicativas, Gibney traz à tona quase uma investigação jornalística ao expor que, se autoridades não falam a respeito, outras saídas são necessárias. Assim, a linearidade de sua estrutura já lhe beneficia por fazer com que o espectador compreenda a linguagem difícil que embarca e seguir uma linha investigativa: depois que Gibney dá de cara com o termo confidencialidade, ele busca jornalistas, hackers, ex-ministros e chefes de inteligência, empresas de segurança e, claro, informantes.

Quase como um lead jornalístico, o diretor nos envolve na discussão sobre o enriquecimento do urânio para chegar exatamente onde quer: os cientistas nucleares assassinados, os ataques vingativos de hackers e o temor de uma nova guerra sem precedentes. Diante do desconhecimento sobre as múltiplas possibilidades oferecidas por essas guerras silenciosas, Gibney demonstra seu próprio terror com o andamento de seu documentário, culminando nas cenas impactantes em que cientistas descrevem malawares que causam danos físicos e vírus que começam no Departamento de Defesa para se alastrar pela humanidade e nos deixar à mercê.

“Se você pode observar uma rede, você pode manipulá-la”, afirma um dos entrevistados. Nessas guerras silenciosas, onde homens podem fazer qualquer coisa em nome da segurança, a frase que descreve perfeitamente a situação vêm do próprio clímax: “nós encontramos o inimigo e éramos nós”.

(5 estrelas em 5)

26. A Garota Desconhecida (Direção: Jean-Pierre e Luc Dardenne.França, 2016)

Ao deixar de abrir a porta do consultório para uma garota que pede ajuda, pois o período de seu expediente havia terminado e descobrir mais tarde que a desconhecida havia sido assassinada, a doutora Jenny começa sua própria investigação para se livrar da culpa que sente. Esse é o ponto primordial da história dos irmãos Dardenne: as nossas ações e o que elas geram de consequência em nossas vidas particulares.

Todavia, aqui, ambos se entregam a uma história vazia e no controle automático, onde as coincidências e as emoções calculadas só não são mais presentes do que as decisões apavorantes da protagonista – ao deixar sempre a polícia de fora ou tentar procurar os criminosos sozinha. Dono de uma honestidade extrema, igualmente, A Garota Desconhecida se repete o tempo todo para inchar ainda mais sua trama e buscar convencer o espectador por cansaço: os pais de um paciente sempre voltando ao consultório para contar uma nova história é exaustivo.

Do mesmo modo, as emoções à flor da pele expostas para estranhos sempre soam falsas, como se Jenny estivesse sendo obrigada a contar sobre seus caprichos ou suas dúvidas. No fim, A Garota Desconhecida irrita não apenas por sua ambientação nonsense, mas pela passividade frente ao óbvio, o que o torna o pior filme dos franceses até agora.

(1 estrela em 5)

27. O Estudante (Direção: Kirill Serebrennikov. Rússia, 2016)

Não houve uma experiência mais exaustiva que O Estudante na Mostra de SP de 2016. Com personagens que vem e vão para gritar passagens bíblicas e desabafar seus problemas sociais, o filme do russo Kirill Serebrennikov entra num caminho sempre interessante: o fundamentalismo religioso e suas ramificações sociais.

Acertando na construção de seu protagonista, Veniamin, o diretor consegue ambientar uma ambiguidade invejável para seu adolescente, já que nunca deixa claro se seus atos solenes à Bíblia e sua pregação não passam de uma forma de expor a hipocrisia social (escola e conservadorismo andam de mãos dadas, afinal) ou se realmente Venia se tornou um discípulo do deus odioso que prega. Kirill debate que ninguém se escora no fundamentalismo sem estar numa situação que esteja oprimido – seja pelo medo, pela tristeza ou pela raiva. Seu roteiro acerta, portanto, ao operar essa sua linguagem com um tom de rebeldia que passa a conquistar seus colegas, já que sua atitude estranha passa a gerar um misto de curiosidade e admiração.

Nessa batalha entre juventude e maturidade, a professora Elena é que acaba se tornando a principal vítima e protagonista do filme de Kirill – ao tentar entender o que faz com que um homem saudável se torne devoto e renegue a ciência. Seus ensaios sobre jesus ser homossexual e seus discípulos a primeira comunidade gay do mundo são um sopro cômico em algo constantemente pesado.

É por isso que seu final se torna algo tão implausível e óbvio. Deixando a ambiguidade que havia nos conquistado até então, o cineasta pensa que o extremo do fundamentalismo nos impactaria mais do que sua sugestão. Um erro que não lhe custa sua narrativa, mas deixa um gosto amargo.

(4 estrelas em 5)

28. Animais Noturnos (Direção: Tom Ford. EUA/Reino Unido, 2016)

Na sua montanha-russa narrativa, o novo filme de Tom Ford (Direito de Amar) tem um desejo supremo: ressaltar a aproximação de um leitor com uma obra e a conexão que criamos com personagens que recém-conhecemos. É por isso que a personagem de Amy Adams, por exemplo, entrega-se tanto para uma narrativa tão cafona quanto a que está lendo – seu passado ainda lhe atormenta e ela não consegue conviver com ele há mais de 18 anos.

Nesta alegoria sobre empatia, Ford rechaça sua mensagem por apostar significativamente no paralelo entre sua trama – que é algo inexistente. Desta forma, um pássaro batendo numa janela enquanto a protagonista lê sobre um tiro no livro ou o manuscrito caindo no chão ao mesmo tempo que um baque acontece na trama de Animais Noturnos são sempre desconcertantes. E se a química entre Adams e Gyllenhall ao menos empolga no campo real, o tom sério que Ford procura dispor na trama literária prejudica, já que passamos a entrar em histórias completamente díspares e tentamos notar semelhanças.

Assim, cenas que dão um certo alívio cômico dentro de seu clima pragmático, como aquela cena em que o xerife interpretado por Michael Shannon ridiculariza sua situação e seu câncer, tornam-se um oásis. Mas, que como num deserto, são escassas.

(2 estrelas em 5)

29. Mulher do Pai (Direção: Cristiane Oliveira. Brasil, 2016)

Em sua casa estreita e de pouca luz, Malu e seu pai Ruben (Marat Descartes, brilhante) começam a ficar mais íntimos, após a morte da vó da garota que gerenciava a casa. O pai cego não pode se cuidar sozinho e Malu precisa amadurecer rápido demais. É assim que inicia o brasileiro Mulher do Pai cuja missão é dar vida para pessoas isoladas da insanidade mundana da cidade e curiosos sobre tudo.

Carregando a mesma essência de Lua em Sagitário, por exemplo, onde “forasteiros” revitalizam as tensões em ambientes familiares, o filme da diretora Cristiane Oliveira aposta na química entre seus personagens, ao mesmo tempo que expõe uma curiosidade pelo corpo. Adolescentes descobrindo o sexo e conversando sobre suas novas descobertas rendem momentos espirituosos. Nem tanto quanto Malu começa a sentir algo estranho por seu pai, quando o vê tomando banho pela primeira vez. Distante todo esse tempo e ainda o chamando pelo primeiro nome, o roteiro provoca esse tom incestuoso que instabiliza o drama açucarado e competente que vinha até então: na aproximação de pai e filha.

Cenas como as da filha descrevendo o filme do Trasnformers para Ruben ou o pai ouvindo as conversas de sua filha atrás da parede (um simbolismo eficiente) são os grandes momentos de Mulher do Pai. Uma pena que a diretora não ache o bastante.

(3 estrelas em 5)

30. O Segredo da Câmara Escura (Direção: Kiyoshi Kurosawa. França/Bélgica/Japão, 2016)

Uma das coisas mais interessantes do terror dramático O Segredo da Câmara Escura diz respeito a projeção do daguerreótipo, um aparelho de fotografia histórico e o grande percussor da fotografia junto com Niépce. Atualizando a invenção para tempos mais contemporâneos e evidenciando a natureza cansativa da fotografia histórica (já que seus primeiros idealizadores ficavam horas para conseguir algumas sombras), Kurosawa poderia brincar com a concepção do tempo de exposição na fotografia da maneira menos terna possível. Infelizmente, não é o caminho escolhido, já que o diretor prefere contar uma história muito mais cafona sobre ilusões fantasmagóricas.

E se ainda o filme ensaia essa entrada no desgaste físico e mental das modelos das fotos, Kurosawa matuta uma ideia de assombração semelhante A Mulher de Preto que nunca funciona, tornando-se involuntariamente risível as aparições da mulher de azul – que nunca é explicada ou colocada como importante para o roteiro. Tudo não passaria de uma fabricação da mente dos fotógrafos de O Segredo da Câmara Escura.

No fim, o passeio acaba sendo tão desgastante quanto ficar parado para ser fotografado por um daguerreótipo.

(1 estrela em 5)

31. Deserto (Direção: Guilherme Weber. Brasil, 2016)

No seu universo selvagem, o diretor Guilherme Weber tem um desejo bem explícito ao decorrer do seu primeiro longa-metragem: a idealização de uma sociedade caótica e similar ao que conheceríamos por mundo. Lá estarão nossos primeiros sonhos, primeiras especializações e, claro, os primeiros contatos com a morte e o assassinato. A sociedade que a trupe circense vive é uma denúncia de um Brasil atual, para Weber, em que o descontrole é invariável.

Não à toa, Weber escolhe personagens alegóricos para representar essa sociedade: artistas que podem fazer o papel, entregando-se por absoluto, sem que critiquemos tanto esse fundamentalismo. O problema do brasileiro é sua controvérsia cínica que cria ao estipular negros e prostitutas sendo representadas por dois homens brancos, sugerindo um debate que não existe. E piora quando as piadas relacionadas ao “Negro” da vila retornam às raízes do racismo adolescente, como quando certo personagem diz que não viu o negro porque estava escuro. Entregando uma natureza caricatural para o papel da prostituta, igualmente, o diretor prejudica uma chance de debate ao passar a expor o homem como um garanhão enrustido.

Por outro lado, o cineasta acerta em constantemente evidenciar a proximidade da vizinhança, assim como as decisões cabíveis a alguns personagens que soam bem convincentes – o padre fechando a porta ao olhar o “Negro” na chibata é revelador. O mesmo da fotografia de Rui Poças, que sempre dando valor ao contraluz e usando grandes angulares para ressaltar as andanças daquele circo, é o que eleva o filme de Weber a uma plasticidade ímpar.

Todavia, a insistência de Weber em garantir essa discussão sobre papéis sociais acaba saindo pela culatra, fazendo com que pareça que o que a sociedade considera monstros circenses sejam exatamente monstros sociais. Uma ironia indesculpável.

(2 estrelas em 5)

32. Estados Unidos Pelo Amor (Direção: Tomasz Wasilewski. Polônia/Suécia, 2016)

No seu universo de personagens infelizes e trágicos, Estados Unidos Pelo Amor compartilha a nudez como seu equilíbrio narrativo para suas múltiplas realidades. “Você é feliz?” pergunta uma das irmãs retratadas pela lente de Tomasz Wasilewski. A resposta dada pelo diretor ao longo do filme parece simples: não, ninguém é.

Numa Polônia que recém respira possibilidades para o futuro, quatro mulheres não se sentem livres ou desimpedidas. Pelo contrário, a provável ausência de opressão faz com que cada uma das personagens sofra invariavelmente com uma depressão cada vez mais acentuada. Todas se perguntam o mesmo: o que diabos fiz com minha vida e agora como faço para arranjar esses lapsos de felicidade? O sexo parece a resposta principal. Agata usa seu marido para promover escapes da realidade em noites quentes, Renata fica obcecada pela jovem vizinha, Marzena, que por sua vez não consegue encontrar sua própria estabilidade. Iza, irmã de Marzena, diretora do colégio, igualmente não sabe como proceder com sua paixão pelo pai de uma de suas alunas que acaba de perder a esposa.

Dono de uma palidez acachapante, o filme de Wasilewski nos traz à essa rotina sempre com uma atmosfera rústica e julgadora: a câmera se aproximando cada vez mais dos personagens, por exemplo, após cenas confortáveis (como a janta que inicia o filme), sublinha essa autoexclusão das protagonistas em suas realidades. Nenhuma se sente confortável em meio a sociedade. O diretor, aliás, sabe o que faz: uma das cenas mais plausíveis da obra é exatamente quando todos são conduzidos em pequenos grupos para um único caminho no domingo – a igreja. Assim, não são apenas os conjuntos habitacionais que parecem os mesmos, mas as vidas daquelas pessoas. Todos seguem o mesmo caminho.

É isso que torna Estados Unidos Pelo Amor uma obra consciente: usar seu retrato de figuras debilitadas a favor de sua melancolia.

(4 estrelas em 5)

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